AS PESSOAS QUEREM ADMIRAÇÃO, MAS NECESSITAM DE AMOR
Na monografia que elaborei num MBA lá na FGV (ihh... faz um tempinho!), escrevi algo sobre a diferença entre o que as pessoas dizem desejar e o que elas realmente necessitam:
“As pessoas querem o poder, mas necessitam de suporte. Querem fama, mas necessitam de reconhecimento. Querem simpatia, mas necessitam de empatia. Querem admiração, mas necessitam de amor.”
Sábio e bonito, não é ? Mais bonito ficaria se fosse uma citação minha, mas não é. Tirei de um livro do Alexandre Rangel (Cliente Interno – São Paulo:Marcos Cobra Editora, 1994).
Bem, a citação permite especular sobre outras situações do dia-a-dia, não menos interessantes. Eu acrescentaria, por minha conta e risco, outras declarações, como, por exemplo:
As pessoas querem chocolate, mas necessitam de carinho. Querem gastar no shopping, mas necessitam de aceitação social. Querem construir mansões, mas necessitam de segurança conjugal. Querem moralizar o mundo, mas necessitam de um confessionário. Querem um carro com alta potência, mas necessitam de torque.
Ah, esta última foi na mosca !! Cheguei onde queria... Seria o foco da minha tese de doutorado em engenharia mecânica. Como nunca cursei engenharia alguma, deixo a tese pra quem quiser, mas insisto na idéia. Você não precisa de tanta potência no motor, mas sim de torque. Como isso já rendeu discussões intermináveis em rodas de amigos, quero compartilhar minha idéia com as pessoas que gostam do assunto (e também com aqueles que ainda estão nas “trevas” em matéria de conhecimento mecânico, rsss...).
Enfim, fiz esse passeio preliminar pelos meandros da psicologia para chegar no motor do carro. Sorry, hoje vou falar somente de motor (e aproveito para confessar minha paixão por eles). Num outro dia, retomarei o gancho acima para filosofar sobre psicologia da motivação humana.
A verdade é que as pessoas escolhem o carro de olho na potência. Isso na melhor das hipóteses, porque muita gente compra o carro sem nem mesmo lembrar-se de perguntar que tipo de motor ele tem (alô Carol !).
Então, há um grande equívoco, porque as pessoas compram potência, mas necessitam de torque. Bem, neste ponto talvez você fique ainda mais confuso, porque muita gente não sabe ao certo qual é a diferença entre as duas coisas. Pior ainda, ninguém conseguiu, até hoje, explicar em linguagem de gente qual é a diferença entre potência e torque, à exceção de uma pessoa. Esse pioneiro é Bob Sharp, que escreve para revistas especializadas em automóveis.
CONCEITO DE TORQUE E POTÊNCIA
Para entender o conceito de torque e potência é preciso lidar com a noção de trabalho realizado. Caminhar por uma trilha rumo ao ao topo de uma montanha é um trabalho. Tirar água do poço com corda e manivela também é. Agora transponha esses exemplos de trabalho para o motor do carro.
Torque é um trabalho do motor. Trabalho que requer força. Força para pôr o carro em movimento, força para subir uma rampa...
Potência tem a ver com esse mesmo trabalho, mas envolve o fator tempo. Isto é, potência é a menor ou maior rapidez com o trabalho é realizado.
Qualquer pessoa normal puxa 100 litros de água do poço em um dia de trabalho (torque). Mas para fazer isso em poucos minutos há que ter potência muscular. Da mesma forma, o atleta que atinge primeiro a linha de chegada numa corrida de curta distância tem mais potência que os demais.
Se dois carros largarem juntos num “pega” subindo uma serra, o que tiver mais potência tem mais chances de chegar primeiro ao ponto final. Está implícita a idéia de tempo para executar o trabalho.
Torque é diferente. Imagine a mesma situação de subir a serra. Coloque duas carretas, cada uma com 500 kg de carga. A primeira carreta será puxada por uma moto Ninja 900 super-potente. A segunda, por um carro-de-boi tracionado por 4 animais.
Certamente, os bois vão chegar lá. A Ninja teria muita dificuldade, em condições normais. Se conseguir, será queimando embreagem e fumegando o motor, embora tenha mais de 130 hp de potência, contra a insignificante potência do carro-de-boi. Por que a carroça consegue? Porque esse trabalho não depende de rapidez, mas apenas de força. A Ninja tem muita potência, mas pouco torque, como é típico das motos esportivas. Com o carro-de-boi ocorre o inverso. Seu conjunto propulsor tem muita força, é adequado para o trabalho pesado. A moto é adequada para o trabalho rápido.
É claro que podemos ter alta potência e alto torque no mesmo propulsor, mas para construir um motor simples, pequeno, econômico, pouco poluente e de baixo custo, quase sempre o fabricante terá de escolher. Ou prioriza potência ou prioriza torque.
Alguns motores até podem ser relativamente leves e pequenos, com alta potência e elevado torque, especialmente os diesel de última geração, como o motor 3.0 da pickup Ford Ranger, que despeja 38,7 mkgf a apenas 1.600 rotações por minuto e 163 cv a 3.800 rpm. Mas nos motores a gasolina, de pequeno porte, sobretudo 1.0, geralmente o torque só estará disponível em altas rotações. Isso não satisfaz. Desejável é dispor de torque logo no início da aceleração, em baixas rotações, porque ninguém anda o tempo todo com o motor ardendo em alta rotação, esgoelando pelas ruas. Então não adianta o torque ficar à sua disposição lá nos 5.000 ou 6.000 giros (no caso de automóveis).
Em se tratando de automóvel, uma boa escolha é o motor que lhe dê alto torque em baixas rotações, sem prejuízo de boa potência nas altas.
Para os padrões atuais do Brasil, um motor com 9 mkgf ou menos está entre os mais fracos. Com menos de 65 cv de potência, idem. Se parece pouco, vale lembrar que o Fusca do início dos anos 60 tinha 7,7 mkgf de torque e 36 cv de potência. É claro que, na estrada, ele pedia paciência ao motorista. Mas tornou-se um campeão de vendas e assíduo freqüentador das estradas brasileiras (muitos deles ainda estão circulando por aí). Quem já gostava de gasolina nessa época há de se lembrar que, no início dos anos 70, o mercado festejou a chegada de um modelo valente. “Esse, sim, anda mais que notícia ruim e não perde velocidade nas subidas!”, diziam os motoristas. Era o Volkswagen Variant, com cerca de 10 mkgf e 65 cv. Realmente, agradava. Tive uma Variant (não significa que eu seja tão velho), que me proporcionou bons momentos...
No outro extremo, hoje pouquíssimos dos modelos nacionais têm acima de 20 mkgf e mais que 140 cv.
Na ficha técnica do carro você pode ter uma idéia da configuração do motor. Veja no manual em que faixa de rotações ocorre a potência máxima e em que faixa ocorre o torque máximo.
Tem uma dica ainda melhor. Se você consegue interpretar o gráfico das curvas de potência e torque, examine quanto de potência o motor entrega nas baixas rotações. Se entregar boa potência nas baixas (e mais ainda nas altas), ótimo. Com certeza terá bom torque em baixas.
Mas lembre-se: valores absolutos não são tudo. Na prática, o que vale mesmo é potência e torque relativos (peso bruto do carro dividido pela potência máxima ou pelo torque máximo).
Compare os valores relativos com os dos demais modelos disponíveis e... boa compra !.
DEFINIÇÃO
Bem, se você conseguiu ler até aqui, deve gostar do assunto. Nesse caso, aproveito para lembrar a definição de potência, que pouquíssimas pessoas conhecem.
Por definição, 1 cv (ou hp) é a potência necessária para levantar um peso de 75 kg a uma altura de 1 metro em 1 segundo. Portanto, 1 cv é igual a 75 kg.m por segundo (75 kg.m/s).
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